SEDE ETERNA: UM ESTUDO SOBRE AS RELAÇÕES COM OS MORTOS NO MUNICÍPIO DE CARIRÉ-CE
Ritual; Morte; Semiárido.
Este trabalho tem como objetivo analisar o culto aos mortos a partir da relação mediada pela
água, sua linguagem e significados. Pondero sobre as adversidades enfrentadas pelo
camponês, sobretudo a escassez de água que é ressignificada e passa a refletir de forma direta
no trato com os mortos. A água assume caráter de maior valor votivo ao ser ofertada ao
morto. As pessoas do povoado colocam garrafinhas de água nos cenotáfios e sepulturas à
beira da estrada e nos cemitérios na tentativa de saciar uma sede que, segundo eles, seria
“uma sede eterna”. Para tanto, realizei entrevistas semiestruturadas com habitantes da
comunidade de Almas, município de Cariré, na mesorregião Noroeste do Ceará, localizado a
266km da capital, Fortaleza. Esta pesquisa tem início, de forma exploratória, em 2016, onde
pude observar a ocorrência da atividade votiva e sua frequência. Essa tradição apresenta
traços de culturas indígenas, europeias e africanas que ao longo do tempo se solidificaram no
imaginário reconstruindo a memória coletiva local e, hoje, se apresenta como um evento
original, posto que se desenvolve em um ambiente geograficamente diferenciado habitado por
um povo singular imbuído numa religiosidade expressivamente plural. Constato, assim, a
importância dada ao elemento água nas práticas mortuárias para manutenção de vínculo entre
os vivos e os mortos na tentativa de satisfazer ou reparar algum sofrimento vivenciado pelo
indivíduo nos seus últimos momentos.